São-marquense que enfrentou sete anos de hemodiálise, hoje celebra um novo capítulo após transplante bem-sucedido
Morador do bairro Francisco Doncatto, Bruninho, o jovem jornalista que venceu o preconceito, enfrentou a diálise desde a adolescência e viu sua vida renascer com o transplante renal realizado neste ano, conta sua história ao São Marcos Online e fala da recuperação.
Bruno Lazaretti (Bruninho) durante sessão de tratamento; morador do bairro Francisco Doncatto, ele luta com coragem e esperança enquanto recebe apoio da comunidade. Foto: arquivo pessoal.
Quando o são-marquense Bruno Lazaretti, 26 anos, conhecido com carinho pela comunidade como Bruninho, sorri, é difícil imaginar quantas batalhas ele precisou enfrentar para chegar até aqui. Morador do bairro Francisco Doncatto, onde vive junto da mãe, Daniela Lazaretti, ele carrega na pele, nos braços e na memória uma história de resistência construída desde os primeiros dias de vida.
Bruno nasceu com mãos tortas radiais, uma condição rara que afeta o desenvolvimento dos braços. A família soube, ainda na gestação, que poderia haver malformações. Após o parto, médicos chegaram a suspeitar que também haveria comprometimentos nas pernas, algo que não se confirmou. Os braços, sim, apresentaram alterações.
“Minha família tinha medo do que eu iria enfrentar. Não pelo meu físico em si, mas pelo mundo. O preconceito, a curiosidade, o julgamento... tudo isso viria cedo. E veio.”
Quando criança, vivendo por um período em Rio Negrinho (SC) e retornando a São Marcos aos três anos, Bruno foi descobrindo aos poucos que sua diferença física chamava atenção. Inocente, acreditava que perguntas viriam das crianças, e vieram, mas de forma natural, leve. O choque mesmo apareceu nos adultos.
“As crianças perguntavam: ‘por que tua mão é assim?’, e eu explicava normal. O problema era quando um adulto puxava a criança e dizia ‘não olha’. Isso dói até hoje. Se tem alguém que deveria ensinar que cada pessoa tem seu jeito, é o adulto.”
Na escola, outra barreira. Uma professora chegou a questionar se ele conseguiria acompanhar a turma. Ele conseguiu, e muito. Criou amigos, se fez presente, se fez visto não pela deficiência, mas pela personalidade afetuosa e determinada.
A vida mudou aos 12 anos
Aos 12 anos, um alerta fez a família procurar ajuda médica. Bruno era baixinho, não crescia no ritmo esperado. Exames, consultas, idas e vindas. Até que veio a frase que ele jamais esqueceu.
“A médica olhou para mim e disse: ‘teu rim é como o de uma pessoa de 60 anos’. Ali meu mundo virou de cabeça para baixo.”
O diagnóstico de doença renal crônica abriu um novo capítulo. Primeiro, remédios. Depois, acompanhamento constante. Em 2018, não houve alternativa: foi necessário iniciar a diálise.
Bruno começou pela diálise peritoneal, em casa, com quatro trocas diárias. A rotina exigia disciplina, cuidado e renúncia. Mais tarde, uma infecção por fungos e bactérias no cateter obrigou a transição para a hemodiálise tradicional, três vezes por semana, quatro horas por sessão, no Hospital Pompeia, em Caxias do Sul.
“Eu ia segunda, quarta e sexta. Chegava, sentava, plugava e ficava vendo o tempo passar. Ali eu entendi que a vida é muito mais frágil do que pensamos.”
Exames de sangue fazia direto no cateter. Não podia tomar direto no braço, a circulação estava comprometida pelo tratamento.
Festas, viagens, praia, Natal, Ano Novo… tudo com hora marcada pela máquina. Enquanto amigos faziam planos de verão, ele observava o mundo pelas redes, tentando acreditar que o dele também chegaria.
A ligação que mudou tudo
Bruno entrou na lista de transplantes. Esperou. Sonhou. Chorou. Foi chamado uma vez, e perdeu a oportunidade.
Até que, numa madrugada, o telefone tocou. O coração, conta ele, parecia que ia “sair pela boca”.
“Minha mãe atendeu. Eu só ouvi ela dizer: ‘ai meu Deus, ele vai fazer’. Eu fui para o hospital chorando, mas era um choro diferente. Sete anos passando pela cabeça. É como se alguém dissesse: tu venceu.”
Às 7h da manhã seguinte, Bruno estava internado. O procedimento foi realizado 100% pelo SUS. Ele ganhou quarto individual, TV, Wi-Fi, acompanhamento humanizado e um futuro.
“A gente fala mal do SUS e não conhece. Eles foram impecáveis. Desde o motorista que me levou até os médicos. Eu devo minha vida a esse sistema.”
O nome da família doadora ele talvez nunca descubra. É sigilo. Mas a gratidão é eterna.
“Se eu pudesse pedir algo às pessoas seria isso: doem órgãos. Depois que a gente parte, nossos órgãos não servem mais para nós. Mas podem salvar alguém que ainda quer viver.”
Planos que agora podem florescer
Com recuperação fluindo bem, Bruno faz acompanhamento e mantém cuidados pós-transplante, mas agora com uma nova vida diante dos olhos. Quer voltar a viajar, terminar estudos, expandir planos, e realizar um sonho antigo: conhecer a Argentina, país pelo qual torce com paixão. Ele é estudante de jornalismo e amante dos esportes, pensa em se tornar um jornalista esportivo que já colaborou com textos e como comentarista para o São Marcos Online.
“Minha vida está só começando. Eu quero olhar para trás e dizer que tudo valeu. Sofri, chorei, parei no tempo por anos. Mas agora eu renasci.”











